Juiz cristão afirma que continuará anulando casamentos gays
Em entrevista exclusiva exibida ontem no
programa Fantástico, da Rede Globo, o juiz Jeronymo Villas Boas falou
sobre sua decisão e negou ser homofóbico.
No último
dia 18, Jeronymo Villas Boas, juiz de Goiás, mandou anular a união
estável de um casal gay. Em entrevista exclusiva ao Fantástico, o juiz
falou sobre sua decisão e negou ser homofóbico.
A
assinatura histórica, que se dependesse do casal homossexual que se
casou em Goiás duraria para sempre, valeu por pouco mais de um mês.
“[O
juiz] comparou o nosso ato para o cartório como um ato criminoso, de um
roqueiro que tira a roupa durante um show no palco”, diz o jornalista
Léo Mendes.
Odílio e Léo foram ao Rio de Janeiro fazer
outra escritura de união estável. “Sim! E não há juiz nesse país que
irá nos separar”, disse Léo, na cerimônia.
A cerimônia
se transformou em um protesto coletivo: 43 casais homossexuais firmaram
compromisso em cartório, inclusive, Odílio e Léo.
Mas
eles nem precisavam ter viajado. A corregedora de Justiça de Goiás
Beatriz Figueiredo Franco anulou a sentença do juiz e deu validade ao
primeiro documento assinado pelo casal. “Eu achei por bem tornar sem
efeito a decisão, dado o alcance administrativo que esta significava”,
diz a corregedora.
O Fantástico foi a Goiás encontrar o
juiz Jeronymo Villas Boas que contrariou a decisão do Supremo Tribunal
Federal (STF) de aceitar a união estável de pessoas de mesmo sexo. A
equipe de reportagem chegou no momento em que ele recebia a notificação
da corregedoria, revendo a sentença.
Perguntado se não teria medo de uma punição, ele responde: “Medo não faz parte do meu vocabulário”.
Mineiro
de Uberaba, 45 anos, casado, pai de dois filhos e vice-presidente da
Associação dos Magistrados Brasileiros. Jeronymo Villas Boas é juiz há
20 anos e diz que se baseou na lei para tomar sua decisão.
“O
que neste ato pretenderam os dois declarantes é obter a proteção do
estado como entidade familiar. Os efeitos jurídicos que se extrairia
disso são efeitos jurídicos de proteção da família. Eles não são uma
família”, afirma.
Ele argumenta que se ateve ao
conceito de família definido pela Constituição brasileira. “Declara no
artigo 16 que constitui família o núcleo formado entre homem e mulher. E
dá a esse núcleo uma proteção especial como célula básica da sociedade.
Família é aquele núcleo capaz de gerar prole”.
Para o
juiz, a união estável de pessoas de mesmo sexo contraria esse conceito
constitucional. Na opinião dele, casais gays não teriam como constituir
nem família nem estado. “Se você fizer um experimento, levando para uma
ilha do Pacífico dez homossexuais e ali eles fundarem um estado, sob a
bandeira gay, e tentarem se perpetuar como estado, eu acredito que esse
estado não subsistiria por mais de uma geração”, argumenta.
A
posição do juiz vai contra a interpretação do Supremo Tribunal Federal
sobre o que é uma família. “O ministro-relator Ayres Britto disse que a
Constituição apenas silencia e, portanto, não proíbe a união
homoafetiva. Em linguagem poética, o relatório dele, aprovado por
unanimidade, diz que família é um núcleo doméstico baseado no afeto e
que os “insondáveis domínios do afeto soltam por inteiro as amarras
desse navio chamado coração”.
Religião
Desde
o ano passado, o juiz Jeronymo Villas Boas é também pastor da Igreja
Assembleia de Deus, que frequenta toda semana. Para os que o acusam de
fundamentalismo religioso, Jeronymo Villas Boas diz que já tomou
decisões contra a sua própria igreja, negando pedidos de isenção de
impostos. E afirma ter outras inspirações. “As pessoas, talvez, possam
querer me criticar porque eu tenho uma forte influência marxista”, diz o
juiz.
De Marx, o fundador do comunismo, a Martin
Luther King, de quem tem um imenso painel. “O Martin Luther King foi um
defensor da igualdade racial, mas também foi um defensor da família”,
destaca.
Em uma biblioteca contígua ao gabinete dele,
Jeronymo mostra à equipe de Vinicius de Moraes, ao famoso ensaio do
psicanalista Roberto Freire sobre o desejo, e até uma bíblia em
hebraico.
Diz que lê de tudo, sem preconceito. Mas não
nega a influência de seus princípios religiosos. “A Constituição
brasileira foi escrita sob a proteção de Deus. Querer que um juiz, que
professa a fé evangélica, não decida questões que envolva conflitos,
muitas vezes, de natureza política, social ou religiosa é negar a
independência do juiz”, pondera.
E afirma que vai
tomar a mesma decisão sempre que houver casos semelhantes. “Já solicitei
de todos os cartórios que me remetam os atos que foram praticados a
partir de maio deste ano para análise”, avisa.
O
repórter pergunta se ele sabe que irá enfrentar uma briga, e Jeronymo
responde: “Não há problema. Se o juiz tiver medo de decidir, tem que
deixar a magistratura. Juiz medroso ou covarde não tem condição de
vestir a toga”.
Já quando perguntado sobre o que fará
se for enquadrado pelos superiores, argumenta: “Eu tenho direito de
defesa. Se me punirem sem o direito de defesa, nós entramos no regime de
exceção”, afirma.
O ministro Luiz Fux, do Supremo
Tribunal Federal, se diz perplexo com a atitude de Villas Boas. Para o
ministro, nenhum juiz está acima das orientações do Supremo. “No meu
modo de ver, a reiteração dessa prática por esse magistrado vai revelar a
postura ostensiva de afronta à Suprema corte. Isso efetivamente vai
desaguar em um processo disciplinar junto ao Conselho Nacional de
Justiça”, alerta Fux.
Fonte: G1
Via: www.guiame.com.br
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